quarta-feira, 30 de agosto de 2006

Do Grande Livro da Vinicultuna e dos Animais - VII

"Surpreendidos pelo primeiro Inverno passado em digressão, os primeiros tunos recolheram a uma gruta. Iam as primeiras semanas de sono quente a meio, foram despertados por um uivo triste. Cá fora, ao frio, uma loba emagrecida (e triste), rondava a entrada da toca, com receio (ou vergonha) e tristeza de entrar.
Os bons tunos comoveram-se. "Queres entrar? Esta gruta é tua? Estás triste? Entra por favor. Afinal estás em tua casa. Porque mesmo que o não fosse, passou a ser no momento em dela tomámos posse. Não estejas triste."
Debalde. A loba, quiçá intimidada pela imponência de Senhores outrora como hoje, se engrandecem quando recebem, não só continuou receosa de entrar (e triste. muito triste), como recuou alguns passos. Se calhar também estava desconfiada.
Mas então, outrora como hoje, um dos Tunos teve uma ideia muito boa, e foi a de uivar, e ele uivava tão bem que até a Loba Triste e Desconfiada achou que por baixo daquelas boas pessoas também estavam bons lobos. E ajoelhou, deitou, e ficou a ronronar baixinho. Ainda com vergonha de entrar, mas já sem medo, desconfiança. Só não temos a certeza se nesta altura ela já não estava triste. Porque, embora o coração já estivesse bem quente, o seu pelo cinzento comprimido a ralificar, estava molhado.
Nas noites seguintes os tunos hibernaram por rondas. Ora à vez um, ora à vez outro, e como eram muitos podiam fazer isto bem feito. E o tuno que estava de vigília vinha até à porta e dizia palavras como "Entra. Aúúúúúúúúúúu. Aúúúúúú´. Não estejas triste. Aúúúúúúúúúú! Ainda me apanhas uma pneumonia", e deixava-lhe à porta, mas mais para dentro, uma malguinha com vinho.
O que os Tunos não se aperceberam - porque como eram mesmo muitos, só de longe a longe é que lhes calhava um turno de vigília é que de turno para turno, a loba se achegava mais à malga, e que a malga.
E também nunca se aperceberam que os tunos anteriores também tinham deixado a sua malguinha de vinho.
O que queria dizer que quando o tuno de vigília saía do posto para interromper a hibernação do Tuno seguinte, a Loba se levantava e ia beber a malguinha do vinho. E estava a gostar muito.
Até que um dia quem acordou o Tuno da hibernação foi a própria Loba, e levou-o até à beira do Tuno de Vigília que dormia do lado de fora da gruta. E a Loba disse que já há algumas noites que os Tunos de vigília ficavam de fora, e a Loba de dentro. E então o Tuno que fora acordado da hibernação pela Loba, acordou o que adormecera de vigília, e em vez de o insultar e dar pontapés, abraçou, cantou "Conquistamos-lhe o Coração. Viva!", e acordaram com canções todos os outros, mesmo os que só tinham turnos de vigília dali a muito tempo.
E abriram-se garrafas de vinho, e não mais a Vinicultuna hibernou.

Pela Primavera, a Vinicultuna saiu da gruta para alegrar a Natureza. Foi a vez da Loba recolher.

E estava Prenha."

da "Fundação de Roma"