terça-feira, 28 de novembro de 2006

Da Estrada

Ao avistá-los levantou-se da berma, sacudiu o cu do capote e acenou-lhes.
Ao verem os seus sinais, fizeram parar as bestas, e o que as conduzia perguntou-lhe
"Para onde vais?"
Dos buracos da lona que descobria a carroça sairam dezenas de cabeças que escutaram.
"Para além", disse apontando o horizonte. "E depois para lá de além", disse, apontando os montes, ou as cidades, ou os oceanos que não se viam por terem o horizonte à frente.
"Já temos o carro cheio, e os animais estão cansados. Dominarás porventura os sons de algum instrumento musical?"
"Se não considerardes o som que as pedras que meus pés jogam, fazem ao rolar na terra, ao poisar na erva, ao desaparecer nas poças, terei de responder não.", disse tornando a sentar-se. "E a minha voz rivaliza com a das ovelhas", acrescentou cruzando as pernas, já depois de passar as mãos pelo solo, e pelo cu do capote.
"Óptimo, sobe e escolhe um instrumento. Precisamos de um solista para o novo original que prometemos apresentar na próxima paragem. Entra depressa pois terás de nos ajudar. Desde o fim da noite estamos com imensa dificuldade, falta de criatividade, dores de cabeça, fotofobia, mal-estar gástrico, alguma pirose, um de nós com palpitações, outro com cagamalcheira, para o compor."

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