Eram camas verdadeiras. Um Hospital de campanha, uma coisa preparada para a evenualidade de uma catástrofe. Saímos da estacao por umas escadas e uns corredores para um edifício contíguo, e havia ali beliches de 3, numa rede de fibra resistente. E havia lugar para todos nós. Até para mim! E à entrada, um polícia, a sorrir com carinho - nao era um policia! era o meu pai! - e entao à enrada, o meu Pai, a sorrir, oferecia um edredao leve a cada mexicano.
Nós só nos ríamos. Acho que nos nossos países nao há nada assim, e, se houver, nao a desperdicamos com gente que dorme nas estacoes de comboio.
Fechei os olhos, mas nao adormeci.
Nao adormeci, porque quando esava mesmo mesmo a entrar no libo do sono, mas mesmo mesmo, um Mexicano comecou a gritar com uma voz de sono, monocórdica, mas muito engracada:
"Que me viengán hacer la cama!",
"Me puengán ropa, que quiero un recuerdo deste hotel!"
"Tiengo claustrofobia!"
"Nos mandáran para las cameras de gas!"
"Quiero ser tratado como una persona!"
"Tiengo cara de perro, pero non quiero una cama chompita!"
no que culminou com um grito de ordem
"Este governo es puto! Este governo es puto! Este governo es puto!"
Eu tambem queria molhar a sopa.
Acho que esta situacao nao era possivel em Portugal, mas se estivéssemos no México, só nos encontraríamos todos deitados numas instalacoes daquelas, com os bracos e as pernas partidas, depois de um motim. E aquele rapaz provavlemente só conseguiria dizer "ai!", "ui!", eventualmente "madre mia", se nao lhe tivessem partido os dentes.
Por isso que me ri tanto, e nao consegui falar.
Faz bem à saúde adormecer a rir.